No dia 11 de julho foi aprovada a Medida Provisória (MP) 832, que instituiu a política de preços mínimos de fretes e designou à ANTT elaborar uma tabela de preços, derivando daí a denominação tabelamento de fretes.
A experiência brasileira permite analisar as intervenções do Estado na economia – a exemplo da informalidade decorrente do tabelamento dos preços da carne nos anos 1980 e sua ineficácia – e antever que esta política terá o mesmo fim das demais. Ainda assim, cabe uma reflexão sobre sua natureza, custos e benefícios já em sua breve existência.
A própria ANTT, em notas técnicas de 2015, afirmou que a multiplicidade de situações (idade e tipo de caminhão, carga, condições da via, etc.) impede a aplicação de tabelas para formulação de preços mínimos. A publicação e a revogação de diversas resoluções em curtíssimo prazo revelam sua natureza política, e não técnica.
As boas práticas regulatórias determinam que a intervenção só se justifica quando há concentração de mercado. Certamente não é o caso do transporte rodoviário de cargas, no qual existem milhares de contratantes e ofertantes (autônomos, empresas e cooperativas de transporte), o que caracteriza um ambiente de livre concorrência. Nesse sentido, o Cade e o Ministério da Fazenda afirmaram que a MP impedirá a competição, levará à formação de um cartel patrocinado pelo Estado com o fim de extrair renda dos usuários, e conduzirá à perda de eficiência do transporte.
Além disso, conforme a ANTT, em 2015, muitas operações economicamente viáveis a preços de mercado se tornarão inviáveis com o tabelamento impositivo, o que estimulará a informalidade em razão da incapacidade de o governo fiscalizar todo o mercado.
A sociedade também arcará com um custo de R$ 73,9 bilhões em distorções e redução da massa salarial, especialmente da população de baixa renda, montante suficiente para concluir quase todas as obras paradas no País em apenas um ano (OESP, 25/6/2018, B1).
Além disso, ANTT, em 2015, e Cade manifestaram entendimento de que preços mínimos acima do mercado estimularão a entrada de novos ofertantes, o que agravará a pressão por redução dos preços dos fretes no longo prazo e prejudicará os próprios transportadores.
Não suficiente, as compras antecipadas de soja e milho da safra 2019 estão em ritmo inferior ao potencial diante do risco de frete, o que gera perdas diárias de R$ 27,7 milhões aos agricultores. De acordo com as intenções de compras, até o momento foram suspensas as aquisições de cerca de 8,4 milhões de toneladas de soja em negócios estimados em US$ 3,1 bilhões.
Essa modalidade de vendas traz consigo um pacote de serviços relacionados à logística, proteção cambial e capital de giro fundamentais para o financiamento de cerca de 28% da safra. A entrega de fertilizantes também será certamente onerada com custos bastante superiores. Com elevação dos custos de produção e de escoamento, a safra de 2019 será seriamente comprometida, o que levará a perdas incalculáveis para a produção animal, exportações, empregos, renda e divisas internacionais. Os consumidores, especialmente os de baixa renda, já sentem o aumento dos preços dos itens da cesta básica.
Infelizmente, o texto aprovado pelo Congresso literalmente proíbe qualquer negociação de preços de fretes abaixo da tabela, algo inconcebível em uma economia de livre mercado na qual entes particulares possuem o direito de comprar e vender serviços em condições mutuamente aceitas.
Esses elementos foram analisados detalhadamente pelo professor Armando Castelar Pinheiro, da FGV, que recomenda a revogação da política de preços mínimos, conclusão semelhante a que chegou a Tendências Consultoria quando analisou, em 2016, o tabelamento da hora parada.
Com impactos dessa magnitude, a sociedade deve ser devidamente informada sobre quem recairão os custos do tabelamento de fretes. Aguarda-se agora do STF a palavra final sobre a constitucionalidade dessa política.
Fonte: Jornal o Estado de S. Paulo (Economia & Negócios)
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