Covid-19 traz dificuldades extras ao setor; agravamento da pandemia retrai índices de retomada
A pandemia do coronavírus tem tirado o sono de empresários do setor industrial, mas, desta vez, por razão diferente da apontada em 2020. Se em março do ano passado, no início da crise sanitária, para 31,25% dos industriais o maior problema enfrentado era a falta de capital de giro, ao fim do mesmo ano, para 85%, o ‘calcanhar de aquiles’ é a falta de matéria-prima para fazer a roda de sua economia girar. A escassez de insumos ou seu custo elevado, puxado pela menor disponibilidade e pelo dólar nas alturas têm causado preocupação nas empresas do Grande ABC.
Os dados, cedidos com exclusividade ao Diário, integram pesquisa realizada com cerca de 50 indústrias do Grande ABC pela CNI (Confederação Nacional da Indústria) e pela Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo), que realizam recorte regional e o compartilham com o Observatório Econômico da Universidade Metodista de São Paulo para compor o Boletim EconomiABC.
A então maior preocupação de quem atua no setor, no pré-pandemia caiu para o quarto lugar após nove meses de convivência com a Covid. Atrás dos problemas com insumos vêm a taxa de câmbio, que flutou entre os patamares de R$ 5,50 e R$ 5,70 no ano passado (57,14%). Para 42,86%, o maior temor se deve à elevada carga tributária e, 28,57%, a falta de capital de giro.
“A pandemia gerou impactos em todo o mundo. E, como nas últimas décadas nossa indústria internacionalizou os processos produtivos, por exemplo, a roda é feita em um país e, o componente eletrônico em outro, um desarranjo dessa rede da cadeia de fornecimentos no Exterior traz escassez e alta dos preços praticados”, explica Sandro Maskio, autor do boletim e coordenador do Observatório.
O especialista aponta que se tratam de oscilações da conjuntura econômica, por isso os motivos variam conforme o período. “Em 2014 e 2015, antes da recessão do biênio 2015/2016, estava entre os maiores percalços a dificuldade em contratar mão de obra qualificada. O que, atualmente, não está entre as grandes preocupações da indústria da região. Embora haja muita gente desempregada e a dificuldade de se encontrar mão de obra qualificada persista, pelo fato de ser uma questão crônica da economia brasileira, o ponto sequer foi mencionado em nenhum dos dois períodos do ano passado, já que há causas mais urgentes para manter as portas abertas”, cita.
O problema da matéria-prima foi acentuado no segundo semestre de 2020, quando as pessoas passaram a compreender um pouco mais as facetas da pandemia e a produção voltou com força, diante da maior demanda do consumidor. Só que, além de parte considerável dos insumos vir de fora do País, o que era produzido internamente também precisava ser reestruturado, já que diante da crise trazida pela Covid, muitas indústrias demitiram por falta de pedidos, em um primeiro momento, e de recursos, posteriormente. E, diante da retomada de vendas, precisaram repor as vagas para dar conta das encomendas.
Foi o caso da autopeça Ferkoda, de Mauá, que chegou a reduzir seu efetivo em 60 trabalhadores e, a partir de novembro, diante do aumento de 25% da demanda, recontratou 70, chegando a 400 trabalhadores, mesmo enfrentando o problema com falta de suprimentos como aço e caixas de papelão. “A maior parte da minha carteira é voltada para a linha branca. Cerca de 85% da minha produção é de queimadores para fogão e, 15%, de peças para ar-condicionado de veículos. Com a disseminação do home office, muita gente ficou em casa e voltou a atenção aos eletrodomésticos, o que fez a procura por meus produtos crescer”, conta o proprietário Norberto Perrela.
Ele conta que tinha a intenção de expandir a produção e elevar o quadro de funcionários para 500, mas, devido às incertezas trazidas pelo recrudescimento da pandemia e das decisões tomadas pelos governos estadual e municipais, como o de endurecer as medidas de restrição para tentar frear a contaminação, a ampliação será gradativa, com aumento de 10% no segundo semestre e chegando a 100 contratações no primeiro semestre de 2023.
“Seguimos todos os protocolos sanitários. O trabalhador está mais seguro na fábrica do que na rua. Mas, ao limitarmos nosso horário de operação até as 17h, deixo de produzir o que preciso. Como posso atender aos grandes players do setor? Se não cumprir com contrato, além de pagar multa ainda corro risco de perder o cliente.”
A instabilidade do cenário pode ser mensurada a partir do ICEI (Índice de Confiança do Empresário Industrial), que em fevereiro de 2020 estava em 63,4 (quanto mais perto de 100 melhor); em abril chegou a 25,2; em outubro, 59,1; dezembro, 63,3; e, em março, 46,3. Quanto ao uso da capacidade instalada, que em fevereiro de 2020 era de 70%; em abril despencou para 39%; em outubro chegou a 71%; e, em fevereiro, recuou a 65%. “A curto prazo, não há milagres ou poções mágicas. Continuaremos dependentes de ação mais eficiente no controle do contágio pelo SarsCov2, e na expectativa da aceleração da vacinação em massa e dos efeitos positivos da mesma”, sentencia Maskio.
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